Falsificação Versus Memória
Quando obras de arte são arrestadas ou apreendidas definitivamente por autoridades policiais em cumprimento a mandados judiciais, assistimos frequentemente a intervenções atabalhoadas, destituídas de procedimentos técnicos adequados, que muitas vezes colocam em risco um patrimônio que, independendo do titular momentâneo de sua posse, são peças do patrimônio de um povo, manifestação e memória de uma cultura. A falta de treinamento específico para esses casos associada ao modus operandi policial, proveniente da práxis cotidiana de lidar com meliantes, faz com que, sem se dar conta, o policial comum, mais das vezes, trate a obra de arte apreendida como algo por assim dizer “bandido”. Sem a delicadeza e atitude protetora que uma obra de arte necessita. O mesmo ocorre com seu depósito judicial que só passa a oferecer segurança à saúde das obras, quando a justiça as coloca sob a guarda de museus de arte. Nas mãos de gente especializada.
Como perito em exames de obras de arte, me preocupei com essa situação e apresentei em 2006, em conferência no Museu de Arte Contemporânea – MAC, da Universidade de São Paulo – USP, por ocasião do VI Congresso em Estética e História da Arte, promovido pelo Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte do MAC/USP, uma Deontologia para o Manejo de Obras de Arte Sub Judice. Em palavras simples, a deontologia é o estudo do que “dever ser”, consideradas as questões científicas e éticas envolvidas.
Posteriormente essa Deontologia foi publicada no Livro ARTECONHECIMENTO (anais do VI Congresso em Estética e História da Arte) – 2006 – pelo Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte do MAC/USP, às páginas 335 – 344.
Reproduzo aqui o artigo na íntegra.
Deontologia para o Manejo de Obras de Arte Sub Judice
1. Introdução geral.
1.1 Conhecimento e consciência
A recorrência dos crimes de falsificação e comércio ilegal de obras de arte, especialmente voltados para lavagem de dinheiro pelo crime organizado, é uma realidade. Se por um lado “ainda não existe em nossas polícias científicas uma cultura para lidar com essa nova realidade” (CAVALHEIRO, 2005), por outro lado nas polícias estaduais e na Polícia Federal, a falta de uma cultura para lidar com a apreensão de obras de arte é ainda mais preocupante. O Perito Criminal não tem formação no campo da arte, mas tem consciência da importância da preservação de uma peça de exame. O policial comum, não recebe orientação alguma nesse sentido. E é a ele que cabe apreender e transportar a obra de arte. A obra é, então, encaminhada a uma Delegacia de Polícia, onde permanece por tempo indeterminado, até que a autoridade policial instaure inquérito policial. O tempo de permanência da obra a espera de encaminhamento, depende de fatores como disponibilidade de homens, investigação preliminar para definir a necessidade da instauração ou não do inquérito policial e, em certos casos, até mesmo de bom senso para que a obra de arte não permaneça por muito tempo em ambiente que possa comprometer sua integridade. Só então será encaminhada à Polícia Científica ou ao departamento correlato de polícias estaduais ou Polícia Federal. As Polícias Científicas, por outro lado, não estão preparadas fisicamente para receber e guardar obras de arte apreendidas. O poder judiciário não tem instalações adequadas para a guarda de obras de arte arrestadas e seus agentes também desconhecem os procedimentos necessários à preservação desse patrimônio cultural. Trata-se muito mais de falta de conhecimentos do que de recursos materiais. Assim a própria justiça e seus órgãos de suporte, acabam colocando em risco a obra de arte judicialmente apropriada e com ela não só o patrimônio, mas a memória que aquela obra guarda.
1.2 Deontologia: uma necessidade ética
Do grego “déontos” que significa “o que é obrigatório, necessário” e “logia”, que também do grego “lógos” significa aqui “tratado”, a deontologia é o estudo dos princípios, fundamentos e sistemas de moral ou o tratado dos deveres. De fato esta Deontologia para o Manejo de Obras de Arte Sub Judice propõe um tratado dos princípios fundamentais a serem observados por todos os envolvidos com a obra de arte judicialmente arrolada: dos que a apreenderão nos locais em que se encontram aos que as receberão, guardarão, farão os exames periciais e guardarão novamente até o deslinde do caso.
1.3 Adequação à realidade policial e jurídica
Para a elaboração formal de uma Deontologia para o Manejo de Obras de Arte Sub Judice, foram examinados outros tratados deontológicos como, por exemplo, o “Código de Deontologia para Museus do International Council of Museums – ICOM” e o “Código de Deontologia para Marchands de Bens Culturais”, da Unesco. Este trabalho está baseado em preceitos museológicos conhecidos e apregoados em literatura especializada, como por exemplo, no Vade-Mécum da Conservação Preventiva do Instituto Português de Conservação e Restauro, adequados à questão da práxis policial e jurídica.
2. Deontologia para o Manejo de Obras de Arte Sub Judice.
2.1 Fundamento básico
As polícias, por preceito jurídico, lidam apenas com suspeitos. Uma vez exarada a sentença judicial o suspeito já não estará mais nas mãos do poder executivo: estará livre se for absolvido ou nas mãos do Poder Judiciário, responsável pelo sistema prisional, se for condenado. No caso de obra de arte apreendida sob suspeita de falsificação, até que laudo pericial forense conclusivo seguido de sentença judicial, confirmando a falsidade, venha à luz, trata-se de obra sub judice que pode também ser verdadeira. Além disso, muitas obras de arte são apreendidas por estarem envolvidas em crimes de outra natureza como, por exemplo, comércio ilegal, roubo ou lavagem de dinheiro. O que em nada diminui seu valor cultural ou de mercado. Existe também o arresto que é uma providência cautelar que consiste na apreensão judicial de bens não litigiosos de um suposto devedor, para garantia de eventual execução que contra ele se venha a promover. Obras de arte autênticas são arrestadas. Outro aspecto digno de consideração é o da importância da obra de arte falsa para estudos futuros, inclusive para o próprio combate ao crime de falsificação de obras de arte.
Assim, o fundamento básico da Deontologia para o Manejo de Obras de Arte Sub Judice é o de conservar a obra apreendida no estado em que se encontra quando de sua apreensão ou arresto.
2.2 Falsificação versus memória
O Filme “O Vingador do Futuro” (Total Recall), de 1990, Dirigido por Paul Verhoeven, baseado em conto do escritor de ficção norte-americano Phillip K. Dick e estrelado, entre outros, por Arnold Schwarzenegger e Sharon Stone, traz uma idéia aparentemente absurda: o implante de falsas memórias no cérebro. É exatamente isso o que a falsificação de obras de arte faz: implante de falsa memória em uma coletividade humana que avilta o passado e desfigura as culturas dos povos. Não há na obra falsificada a verdade do tempo que ela finge testemunhar. Não há nela a expressão da alma do artista. A obra falsificada é o embuste da história. Retrata um tempo que nunca aconteceu e sentimentos que jamais foram sentidos. Sem mencionar os prejuízos imediatamente mensuráveis oriundos do comércio e de sua utilização para lavagem de dinheiro pelo crime organizado. A obra de arte tem o poder de historiar os sentimentos do homem em sua marcha no tempo. É um registro capaz de desvendar mistérios não registrados por escrito. Através da arte podemos conhecer, por exemplo, a história do homem antes da escrita, período a que se convencionou chamar pelo discutível nome de pré-história. Discutível à medida que a manifestação plástica já estava lá desde os evos dos tempos, desde pelo menos o paleolítico superior, a registrar a passagem do homem sobre a Terra. O registro feito pela arte é muito delicado, pois requer leitura acurada, sensível e envolvida. Requer pesquisa sobre seus elementos contextualizantes, quando disponíveis. E se indisponíveis, requer pesquisas sobre seus contextos. Esse registro delicadíssimo fica adulterado pela obra falsificada e, conseqüentemente, nossa história vira uma mentira. É como se pegássemos todos os registros de nascimento dos antepassados de uma determinada família e os adulterássemos: certidões de nascimento, de casamento, de óbito. É como se adulterássemos as fotografias de família, os relatos escritos em diários e tudo o mais que houvesse como registro da existência desse núcleo familiar e oferecêssemos o material adulterado a um novo membro daquele grupo consangüíneo como relato da verdade sobre o passado do seu clã. Seria algo indefensável para uma criança. Sua história pregressa seria o fruto da invenção dos falsificadores desses registros. Seria um verdadeiro implante de falsa memória como na ficção. Mas, infelizmente aqui não se trata de ficção: a falsificação de obras de arte é uma realidade avassaladoramente presente em todo o mundo e compromete a noção de quem somos e de onde viemos.
2.3 Apreensão ou arresto da obra de arte
O responsável pela apreensão ou arresto de obras de arte deve observar procedimentos que embora sejam aparentemente simples, são importantíssimos para sua proteção e preservação. São eles:
2.3.1 Utilização de luvas de algodão
Nossas mãos por mais higienizadas que estejam possuem na pele uma proteção natural gordurosa e ácida. Esse material se deposita sobre a obra e age como bomba de efeito retardado: com o passar do tempo ataca a capa pictórica das pinturas e outros materiais como a celulose de gravuras e outras obras sobre papel. Também as esculturas podem sofrer a agressão dessa substância, especialmente as de pedra como o mármore. As luvas de algodão requerem atenção especial para que a peça não escorregue das mãos. Mas, ainda é o material mais indicado para o manuseio de obras de arte. Em caso de peças grandes e pesadas convém usar luvas de algodão mais grossas com aplicação de pontos de borracha em suas palmas.
2.3.2 Não tocar nas telas
Não se deve colocar as mãos, mesmo com luvas, em contato com as telas. As telas são feitas de tecidos esticados sobre um chassi de madeira. Quanto mais antigas, mais ressecadas e frágeis. Muitas vezes um leve toque de instrumento pontiagudo é suficiente para rasgar uma tela. O toque das mãos sobre a tela pode provocar deformações e até rasuras no tecido. Deve-se utilizar o chassi ou a moldura como pontos de apoio para manuseá-las.
2.3.3 Não colar etiquetas nas obras
Não colar etiquetas diretamente nas obras de arte. Nem etiquetas do tipo auto-adesivas. As colas comuns e as existentes nas etiquetas auto-adesivas, não contêm pH neutro2, por isso acabam atacando o material a que são aplicadas. Além disso, as bordas da etiqueta tornam-se área de adesão para pó e microorganismos que também atacam as obras. Dificultam a limpeza e interferem na peça. Existem outros químicos presentes em etiquetas de papel que podem atacar certas obras como, por exemplo, alvejantes utilizados para o branqueamento de etiquetas em sua fabricação. Obras de pintura, gravura e madeira policromada são as mais sensíveis às etiquetas auto-adesivas ou colas. Caso seja necessário etiquetar a obra, fazê-lo na molduragem, na parte inferior da base das esculturas ou, em último caso, em áreas discretas da peça, porém nunca sobre áreas pintadas. Independentemente do processo de pintura utilizado.
2.3.4 Não utilizar materiais agressivos
Ao embalar a obra, não utilizar fitas gomadas ou adesivas, clipes, grampos ou outros materiais metálicos. Verificar se os lacres de plástico rígido estão em posição de não ofender a superfície da tela de pintura, ou obra sobre papel, por prensagem na hora do transporte.
2.3.5 Embalagem das peças
As obras devem ser embaladas em plástico do tipo “bolha” e acomodadas
para transporte com espaços entre si. Amontoados de plástico bolha ou isopor são úteis
para preencher o espaço entre elas. O plástico bolha deve ser aberto assim que a obra chegar ao seu destino.
2.3.6 Observar aberturas para respiro
É procedimento comum às polícias a colocação de peças apreendidas em sacos plásticos onde são lacradas. No caso de haver necessidade indispensável desse procedimento observar que haja respiro nesse saco plástico e ele possa ser aberto o mais rápido possível. Aberturas permitem à obra respirar e trocar níveis de umidade com o ambiente exterior. A obra fechada em saco plástico sem possibilidade respirar, se deteriorará. É importante observar que o ensacamento e lacração da obra não a protege contra choques durante o transporte e por isso é procedimento inadequado quando mais de uma peça tiver que ser transportada ao mesmo tempo.
2.3.7 Não fumar perto das obras
Não se deve fumar em contato com obras de arte em nem mesmo no ambiente em que elas se encontram. Os elementos químicos presentes na fumaça do cigarro e nos gases emitidos por ele, quando há presença de odor mesmo sem fumaça visível, atacam os pigmentos e os suportes das obras.
2.4 Transporte da obra de arte
De antemão sabemos ser impossível aplicar as práticas ideais de transporte de obras de arte, no caso de apreensão ou de arresto. Especialmente quando a apreensão se dá em flagrante delito ou mesmo em diligência amparada por mandado judicial. Até mesmo para empresas especializadas o transporte de obras de arte é sempre operação delicada. Há uma série de incidentes que podem ocorrer, mas as falhas humanas podem ser evitadas com um pouco de conhecimento de causa. Os princípios aqui descritos não correspondem aos cuidados necessários para o transporte de obras de arte para longas distâncias, onde se utiliza embalagem especial para cada obra e o processo de embalagem é absolutamente técnico. O transporte profissional de obras de arte não admite ausência de seguro, por exemplo. Oferecemos neste trabalho uma adaptação para a situação policial que é totalmente atípica se tomarmos por referência o transporte técnico de obras arte. Portanto são regras mínimas de segurança e devem ser observadas.
2.4.1 Não amontoar as peças
O primeiro princípio a ser observado é que obras de arte não podem ser amontoadas. Obras amontoadas podem danificar-se entre si, mesmo se embaladas adequadamente.
2.4.2 Tipos de veículos para transporte
Utilizar viaturas do tipo furgão em caso de obras cuja dimensão seja compatível com esse tipo de veículo. Transportar obras de pintura em porta-malas comuns de viaturas é totalmente desaconselhável, mesmo sendo uma única tela: o calor intenso sobre o porta-malas irá deformar a madeira do chassi da tela e comprometer seriamente a capa pictórica. No Brasil temos temperaturas altas e grandes variações de temperatura em um mesmo período do dia. Assim, seria ideal que o veículo destinado a transportar obras de arte fosse equipado com ar condicionado. A variação de temperatura assim como temperaturas altas, são fatores de deterioração da obra de arte. Caso a quantidade de obras seja maior do que a possibilidade de transporte com segurança, deve-se recorrer a serviço terceirizado de empresa especializada nesse tipo de transporte.
2.4.3 Se o veículo for policial a missão deve ser única
É comum na lide policial, uma viatura sair para determinada diligência e no caminho de volta acorrer em apoio à outra viatura policial envolvida em alguma ocorrência em andamento. Ao destinar-se uma viatura policial para a apreensão de obra(s) de arte, deve estar claramente determinado que essa viatura entregue o material apreendido a seu destino sem oferecer apoio a quaisquer ocorrências em andamento. Seria ideal que essa viatura estivesse proibida, por instrumento legal, de atender a qualquer chamado intercorrente a esse tipo de missão. Desta forma os policiais incumbidos de apreender obras de arte estariam livres de eventual acusação de crime de prevaricação pelo não atendimento a uma chamada inesperada. No caso de obras de arte, sua fragilidade e valor cultural, impedem uma viatura que as transporta de participar de perseguições policiais, tiroteios e direção agressiva. Além disso, as obras de arte não devem ficar por tempo demasiado dentro do veículo que as transporta, especialmente se esse veículo não tem controle de temperatura. O que normalmente as viaturas não possuem.
2.4.4 Transporte de obras de pintura
Com os pés na realidade, sabemos ser impossível para as polícias manterem viaturas especiais para transporte de obras de arte. Uma solução seria a construção de um trainel móvel, adaptável no interior de um furgão quando houvesse diligências envolvendo obras de pintura. Esse trainel seria basicamente um engradado de madeira ou metal, fixável no piso do furgão, contendo divisões feitas de implexos de cordões, de forma a acomodar telas ou quadros sobre papel emoldurados na posição vertical. Cordões esticados são firmes e levemente flexíveis. As telas devem ser presas a cada divisão de modo a não correrem durante o transporte. Esse tipo de trainel é fácil de fazer. O setor de manutenção da unidade policial facilmente poderá providenciá-lo. Mas caso seja impossível preparar esse suporte, observar a acomodação das telas de pintura da seguinte forma: face contra face, chassi contra chassi, sempre cruzando eixo vertical contra eixo horizontal das telas retangulares e sempre embaladas individualmente em plástico bolha.
2.4.5 Transporte de obras sobre papel, sem moldura
Para transportar obras de pintura ou gravura sobre papel, sem moldura, é indispensável a utilização de pastas portfólio de tamanhos A2, A1 e A0. Essas pastas são dotadas de divisões plásticas, capa resistente e alça. Nesse tipo de pasta a obra em papel pode ser transportada sem ser enrolada e protegida contra amassamentos, rasuras e sujeira. Não se deve transportar obras em papel enroladas em tubos, no caso de obras de dimensões muito grandes, maiores que A0, cobrir a face da obra com papel de seda e enrolar em tubos de diâmetro largo. Neste caso cuidar para que o tubo ultrapasse bem o comprimento do papel e calçar a folha enrolada com plástico bolha.
2.4.6 Transporte de têxteis
Tapetes e tapeçarias devem ser transportados em rolos grossos. Não dobrar esses rolos. Outros têxteis como vestes etc., também não devem ser dobrados e sim embalados com papel de seda ou tecido branco e limpo. Não amontoar têxteis que possuam decorações salientes.
2.4.7 Transporte de esculturas e objetos
Esculturas e objetos tridimensionais devem ser embalados com atenção para não deixar pontos frágeis desprotegidos. Cuidado com os pontos de apoio. Não pegar a obra pelas partes mais frágeis como cabeça, braço, pés, no caso de figura humana. Embora tenham aspecto robusto, as partes mais delgadas de esculturas e objetos, podem se quebrar facilmente. No veículo, cuidar para que a escultura esteja presa de tal forma que não possa movimentar-se durante o percurso.
2.4.8 Cuidado ao manusear obras de arte
Toda a movimentação próxima a obras de arte deve ser cautelosa e atenta. Evitar movimentos bruscos e ações de afogadilho são recomendações indispensáveis. A obra de arte não é ou possui peça de reposição disponível no mercado. Uma das características de uma obra de arte é ser única.
2.5 Guarda da obra de arte
2.5.1 Depósito técnico
Existe um conceito museológico de “Reserva Técnica”. Trata-se de um local provido de todas as condições de segurança para a obra de arte, não só contra furtos e vandalismo, mas contra os agentes de deterioração. A maioria dos museus tem reserva técnica permanente, que abriga as obras de seu acervo e uma reserva técnica provisória para obras não adquiridas pelo museu. No caso das polícias e organismos judiciais um único espaço basta. Vamos chamá-lo aqui de “Depósito Técnico” por duas razões: para oferecer nomenclatura diferenciada daquela utilizada pelos museus e para evidenciar a transitoriedade da permanência da obra de arte nesse espaço. O Depósito Técnico para Obras de Arte, deve oferecer condições de conservação das peças. Para isso deve atender a quesitos mínimos de segurança. Em caso de impossibilidade em providenciar a instalação de um Depósito Técnico, transferir a guarda da obra apreendida ou arrestada a um museu que possua reserva técnica em condições ideais.
2.6 Durante a peritagem da obra de arte
Os preceitos deontológicos a serem seguidos pelos responsáveis em realizar os exames periciais em obra de arte apreendida são: • Preceitos descritos nos itens 2.3.1 a 2.3.3; 2.3.7 e 2.4.8. • Preservar a obra no estado em que se encontra. • Dar preferência sempre a técnicas não destrutivas de exame. • Retornar a obra ao Depósito Técnico ao final de cada dia de trabalho. • Se interferências que alterem o estado da obra quando de sua apreensão, mesmo que positivas para ela, tiverem que inevitavelmente ser empreendidas para a viabilização de um determinado exame, o perito deve promovê-las em áreas ocultas como, por exemplo, as bordas viradas de uma tela de pintura. No caso de necessidade de interferência na área da pintura, como remoção de verniz oxidado, pedir autorização judicial para o procedimento. Embora seja procedimento benéfico à obra e devolva a ela sua aparência original, altera a aparência da obra quando de sua apreensão. Proceder a interferências dessa natureza em obra apreendida somente se todas as outras possibilidades de exames tiverem sido esgotadas.
Palavras finais
O eixo ético da Deontologia para o Manejo de Obras de Arte sub-judice é a proteção e preservação da obra de arte no estado em que se encontra quando de sua apreensão. A especificação dos quesitos técnicos de segurança para um Depósito Técnico para obras de arte é tema de trabalho suplementar a este.
1 Orientadora da Pesquisa, Profª. Drª. Elza Ajzenberg. Pesquisa de caráter interdisciplinar que contou com a colaboração dos pesquisadores Profª. Drª Dalva de Faria do Laboratório de Espectroscopia Molecular do Instituto de Química da USP e Prof.Dr. Adonis Saliba do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares / Comissão Nacional de Energia Nuclear – IPEM/CNEM.
2 pH significa “Potencial Hidrogeniônico”.
Quím. Logaritmo decimal do inverso da atividade dos íons de hidrogênio numa solução: pH.
As soluções ácidas têm pH menor que 7; as básicas, maior que 7; e as neutras, em torno de 7
__________________
Bibliografia
ALMEIDA, Anabela e CASANOVAS, Luis Elias. Conservação Preventiva – Vade-Mecum. Lisboa: Instituto Português de Conservação e Restauro, sd.
CAVALHEIRO, Pedro Jacintho. Exames Periciais Forenses para Pintura. São Paulo: Dissertação de Mestrado – ECA/USP, 2005.
MAIOTTI, Ettore. Grande manuale delle tecniche d’arte. Milano: Fabbri Editori, 1993.
OURIQUES, Evandro Vieira (org) et ali. Manuseio e embalagem de obras de arte. Rio de janeiro: Funarte/Instituto Nacional de Artes Plásticas, 1989.
SECRETARIA DE ESTADO DA CULTURA / SUPERINTENDENCIA DE MUSEUS. Caderno de Diretrizes Museológicas I. Belo Horizonte, 2002.